Pesquisa comprova a eficácia da atenção plena na administração do estresse. A sócia-executiva a instrutora da Nortus, Luciana Sutti, revela o que a ciência já sabe a respeito do mindfulness.

Todos os estudos científicos sobre meditação concentram a atenção no funcionamento do córtex pré-frontal, pois é o local onde se gerenciam os circuitos de atenção voluntária do cérebro. De acordo com o neurocientista Paul McLean, nosso cérebro se desenvolveu incorporando funções cada vez mais complexas. Mas o que mindfulness tem a ver com o nosso cérebro?
A estrutura evolutivamente mais antiga é o cérebro reptiliano, responsável pelas programações automáticas que se referem aos instintos de sobrevivência, como o medo, por exemplo.
Depois, o que se desenvolveu foi o cérebro límbico, responsável por gerenciar respostas fisiológicas frente a estímulos emocionais. Os primeiros mamíferos a apresentarem um sistema límbico começaram a cuidar dos filhotes, coisa que os répteis não faziam.
Por último, na escala evolutiva, formou-se o neocórtex, estrutura responsável pelo pensamento cognitivo, presente nos mamíferos superiores. Nos humanos, o córtex pré-frontal (CPF) assume proporção maior no neocórtex do que em outras espécies.
Pensar requer energia
Esta adaptação evolutiva trouxe um alto custo energético. O cérebro utiliza 25% da energia corporal, e o córtex pré-frontal utiliza 50% da energia disponível para o cérebro. Por este motivo, sempre que possível, o cérebro funciona em modo automático para poupar energia.
O córtex pré-frontal, centro executivo do cérebro, é responsável pelo aprendizado, reflexão, decisão e pensamento a longo prazo. Nos humanos, é também responsável pela capacidade de autoconsciência e de metacognição. Paradoxalmente, estas capacidades do córtex pré-frontal (CPF) nos trazem desvantagens:
- Capacidade de antecipar o futuro – e se preocupar com isso (ansiedade);
- Capacidade de pensar sobre o passado – e se lamentar (depressão).
Frente a alguma ameaça (real ou imaginária), os centros emocionais do sistema límbico são ativados, em especial a amígdala. Com isso, toda uma cascata de neurotransmissores e hormônios é liberada, como cortisol e adrenalina, preparando o organismo para lutar, fugir ou paralisar.
- O sangue sai das vísceras e vai para os músculos;
- Sistema imunológico é interrompido para economizar energia;
- A respiração se torna mais rápida e superficial.
Antes, os fatores estressores eram biológicos, como, por exemplo, ser surpreendido por um predador. Neste caso, o estresse desencadeado era temporário, e o corpo se recuperava ao eliminarmos o perigo.
Hoje, os estressores são fatores psicológicos em que podemos interpretar certas situações como risco. Por exemplo, uma apresentação do orçamento para a diretoria, uma reunião com o chefe, o gerenciamento de conflito entre dois membros da equipe, pegar um engarrafamento quando se está atrasado, ou ter uma conversa desafiadora com o cônjuge.
Estas situações acabam disparando hormônios que nos fazem sentir medo, ansiedade e raiva. A consequência é um estresse permanente, mantendo o cortisol alto de forma crônica. Frente à raiva ou ansiedade, acontece uma dança entre o córtex pré-frontal (CPF) e os centros emocionais no sistema límbico (amígdala).
Distração e ansiedade têm a mesma origem
Se estamos no automático, ocorre o sequestro da amígdala como um comportamento-reflexo, e a função executiva do cérebro é paralisada. Sequestro da amígdala significa que esta inibe a ativação de outras áreas cerebrais, especialmente do córtex pré-frontal, responsável pelo pensamento lógico e o planejamento de nossas ações.
Ou seja, diante uma situação de estresse, somos menos inteligentes. Isso explica por que ficamos distraídos quando estamos ansiosos – a amígdala prende nossa atenção no que julga perturbador, e por isso, quando algo nos preocupa ou aborrece, a nossa mente vaga para este ponto de fixação, gerando os pensamentos circulares.
Se assumimos o controle ativo da nossa atenção, mobilizamos circuitos pré-frontais, e a amígdala se acalma. Ao respirarmos lenta e profundamente, acionamos o mecanismo de relaxamento do corpo. Grande parte desse efeito calmante da respiração é devido a um neurotransmissor chamado ácido gama aminobutírico (GABA), o principal neurotransmissor inibitório do sistema nervoso.
Ao perceber que outra pessoa está ativada emocionalmente, um mecanismo para ajudá-la a mobilizar o córtex pré-frontal é fazer perguntas. Para responder, ela terá que sair do modo automático, e isso poderá contribuir para que consiga fazer a autorregulação entre os circuitos pré-frontais e a amígdala.
Estudo comprova eficácia do mindfulness
Estudos conduzidos pelo Dr. Alan Wallace, criador do Mindful Attention Training, comprovam que a prática de mindfulness acalma a amígdala.
A pesquisa sugere que benefícios maiores são conquistados na medida do esforço pessoal, como se houvesse um algoritmo dose-resposta. O cérebro de praticantes de meditação tem nível menor de reatividade da amígdala. No grupo de meditadores de longo prazo, observou-se tanto a redução da reatividade da amígdala quanto o fortalecimento da conexão entre córtex pré-frontal (CPF) e amígdala.
Ou seja, por meio da prática de mindfulness, desenvolvemos maior capacidade de administrar o estresse. E quanto mais forte é a conectividade operativa entre córtex pré-frontal e amígdala, menos seremos vítimas de gangorras emocionais de qualquer tipo.
Ref. bibliográfica: A ciência da meditação – como transformar o cérebro, a mente e o corpo. Daniel Goleman & Ricahrd J. Davidson (Richie) – Ed. Objetiva
*Luciana Sutti é sócia-executiva da Nortus, especialista em neurociências aplicadas à liderança e coaching. Atua no NeuroTrainingLab como observadora sênior.
É coach executiva e de carreira pelo ICI, com formação internacional reconhecida pelo ICF. Estuda e pratica mindfulness desde 2004.